Luiz Cláudio Lima e Fábio Bombarda, são intensivistas que lidam com pacientes graves nas UTIs adulto e respiratória


Por: Alessandra Nogueira/ Regional Press

Nas salas de acesso restrito, o som dos bipes de monitores chamam a atenção, assim como os pacientes graves, muitas vezes intubados, que lutam pela vida. É neste ambiente que os médicos intensivistas atuam incansavelmente para cuidar dos doentes, com patologias diversas, que necessitam de cuidados especiais. Durante a pandemia, ficou ainda mais evidente a importância destes profissionais, cuja experiência neste período pode ser resumida em angústia, decepção, medo, aprendizado e superação.

Em 10 de novembro é comemorado o Dia do Médico Intensivista, especialidade relativamente nova em comparação a outras, mas que ganhou destaque nos últimos 50 anos, por agrupar pacientes graves em uma ala exclusiva. O novo coronavírus lançou um novo olhar para esta área da Medicina e ganhou ainda mais importância quando o assunto é salvar vidas.
As catástrofes humanitárias, em que pese os dramas que trazem consigo, possibilitam avanços, sejam tecnológicos ou humanos. Foi assim na 1ª Guerra Mundial, quando foi levada uma Medicina ao campo de batalha diferente do que se via nos hospitais da época. Um exemplo foi a participação da cientista Marie Curie, que levou para as trincheiras o seu recém-descoberto Raio X, para examinar os soldados feridos, na tentativa de salvá-los dos traumas sofridos.

Durante a pandemia, não foi diferente. Por mais que pouco se conhecesse a respeito do vírus mortal, os intensivistas estudaram, lutaram para garantir medicamentos e equipamentos a seus pacientes e, mais do que isso, doaram a própria vida ao estar na linha de frente contra o temível coronavírus.

O médico Luís Cláudio Lima, que é também nefrologista e atua há 35 anos como intensivista na Santa Casa de Araçatuba, compara o enfrentamento à pandemia como uma guerra em que havia um inimigo desconhecido e que pegou todos desarmados. "Tivemos de enfrentar com a cara e a coragem, inclusive às custas de perdas de muitos profissionais", afirmou ele, que é o responsável técnico pelas UTIs Geral  Adultos e Respiratória.
Para ele, o coronavírus acabou criando uma nova era para a ciência, na qual os profissionais foram aprendendo em meio à guerra e, gradativamente, conseguiram mudar o destino das muitas batalhas entre a vida e a morte. 

Em meio a sentimentos de angústia, medo e, muitas vezes, de decepção, os médicos intensivistas conseguiam reunir forçar para continuar. "Vontade de desistir todo mundo teve, mas somos profissionais e seguimos em frente", observa Lima.

O médico Fábio Bombarda, que atua há 17 anos como intensivista na Santa Casa, disse que, com a pandemia, foi necessário instalar um outro hospital dentro do hospital. Foi montada uma estrutura com 25 leitos de UTI Covid que, muitas vezes, trabalhou acima de sua capacidade, improvisando outros leitos para que nenhum paciente grave ficasse sem atendimento.

Para ele, o mais marcante neste período foi evolução rápida da doença em alguns pacientes, que entravam bem no hospital e, em poucas horas, evoluíam para um quadro grave. Outra mudança trazida pela pandemia foi na relação com as famílias, que não podiam ter contato com seus entes queridos, por tratar-se de uma doença infectocontagiosa.

"A relação olho no olho com os familiares, para passar o quadro do paciente, acabou prejudicada. Algumas vezes, ainda conseguíamos conversar com a família, mas na maioria dos casos, tínhamos que informar os óbitos por telefone. Nós, funcionários, ficávamos presos dentro do hospital, e os familiares, do lado de fora", relatou o médico, dizendo que este também foi um fator de angústia para os profissionais.

Outro momento marcante para os profissionais foi quando enfrentaram a escassez de anestésicos para manter os pacientes intubados, o que ocorreu no Brasil inteiro, assim como a crise de oxigênio que se abateu pelo País. Nesta fase, tiveram que substituir medicamentos sem prejuízo dos pacientes. "Nós conseguimos superar esta crise trabalhando de maneira racional, com muito estudo e substituições", disse. 

Conforme ele, o maior medo ocorreu quando o hospital ficou lotado. "A gente não sabia era o meio ou se era o fim, havia esta angústia. E se aquele momento que a gente estivesse lotado fosse a metade?", questiona.

A Santa Casa de Araçatuba recebeu, no período de 12 de março de 2020 (data da primeira internação) até outubro de 2021, 3.033 pacientes internados por suspeita ou diagnóstico confirmado de Covid. Deste total, 1.327 foram para a UTI Respiratória.
Os períodos de pico foram registrados em junho de 2020, com 118 internações contra 49 em relação a maio daquele ano. Em 2021, a situação se agravou ainda mais, com média de 200 internações ao mês e picos de 250, 300 e até 374 pacientes internados em enfermarias e UTI para o tratamento da infecção pelo novo coronavírus.

Na UTI, as médias mensais foram entre 50 a 80 pacientes, com picos que variaram de 100, 127 e até 159 pacientes por mês.
O hospital possui 13 médicos plantonistas da especialidade Medicina Intensiva (adultos); 49 especialistas neonatal e pediátrico e um total de 60 leitos de UTI, sendo: 10 na UTI Coronariana; 10 na Geral Adultos; 20 na Respiratória; 10 na Neonatal 1, dos quais 3 pediátricos; 10 na Neonatal 2.

As UTIs, que ganharam destaque com o advento da pandemia, no entanto, atendem pacientes de todas as patologias e servem de apoio a todas as especialidades, pois atendem desde as vítimas de acidentes graves até os pacientes que passam por cirurgias complexas e têm um pós-operatório que necessita de cuidados especiais e monitoramento contínuo.

O médico Fábio Bombarda lembra que a UTI tem mais de 50 profissionais que atuam durante 24 horas, entre médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem, fisioterapeutas, psicólogos, nutricionistas, além da equipe de limpeza. 


Mortalidade em Araçatuba foi menor em comparação a outras regiões

Com a pandemia, pela primeira vez a Santa Casa de Araçatuba passou a monitorar óbitos de uma patologia específica, no caso, a Covid-19. No município, a mortalidade ficou abaixo da média de São Paulo e de outras regiões com mais recursos, como Campinas e Ribeirão Preto. 

O médico Fábio Bombarda explica, no entanto, que é difícil comparar a mortalidade entre hospitais, porque cada região vive uma realidade diferente. Ele cita, por exemplo, que em um município onde a atenção primária é ruim, os pacientes terão mais pressão alta, a diabete não controlada e infartam mais, o que não ocorre em localidades onde há acompanhamento destas patologias nas Unidades Básicas de Saúde (UBSs). 
"Tanto que o Estado não tem um score de hospitais com os índices de mortalidade, não dá para comparar", argumenta.

Além disso, a mortalidade está diretamente ligada à gravidade do quadro dos pacientes. No caso de doentes com Covid que necessitaram de hemodiálise, por exemplo, o índice de óbitos foi de 80% em todo o País. Já entre os que não precisaram ser intubados e nem de diálise, o porcentual de morte foi bem menor.
"Em um hospital que atende pacientes gravíssimos, a mortalidade é muito mais alta. Portanto, não tem como comparar laranja com banana", disse.

Ele ainda faz uma comparação entre um paciente que teve um descompensação cardíaca e outro que foi atropelado, perdeu membros e passou por quatro cirurgias. "O primeiro tem riscos, mas a chance de vir a óbito é muito menor que o segundo, que está numa situação extrema", exemplificou.


Pandemia aumentou acidentes domésticos entre crianças

O médico pediatra Anderson Azevedo Dutra, responsável técnico pelas UTIs Neonatal e Neonatal Pediátrica, disse que, inicialmente, os seus pacientes (bebês, crianças e adolescentes) não foram tão afetados pela gravidade da Covid, que atingiu mais idosos e adultos.

No entanto, o número de acidentes domésticos aumentou com a quarenta que exigiu que as famílias ficassem em casa. Com isso, houve mais quedas e a ingestão de corpos estranhos entre as crianças. "As patologias mudaram e mantivemos o mesmo ritmo de trabalho", disse.

Ao longo da pandemia, foram atendidos 168 pacientes pediátricos com suspeita ou diagnóstico positivo para Covid, dos quais 149 ficaram na UTI Neonatal e Pediátrica. Conforme o médico, houve, ainda, 32 casos de Síndrome Inflamatória Multisistêmica. "Foi um período bastante intenso, mas, felizmente, sem nenhum óbito", afirmou.

Nesta fase, foram criados cinco leitos exclusivos para Covid na UTI Pediátrica. Além da infecção pelo novo coronavírus, o setor que atende bebês e crianças em estado grave também teve de lidar com os outros casos, como a prematuridade dos recém-nascidos, considerada alta na região, além de câncer, doenças respiratórias e outras infecções. 
"Nós lidamos desde com recém-nascidos de 27 semanas com 400 gramas até com adolescentes de 17 anos com 80 quilos", explicou

O intensivista e neonatologista Anderson Azevedo Dutra e equipe médica da UTI Neonatal e Pediátrica